O Baile Funk dentro da maior favela de SP
Baile Funk em Heliópolis: Problema ou diversão?
Muita gente questiona como é o Baile do Helipa, aliás é uma das coisas mais difundidas da maior favela de São Paulo fora dela, mas o Baile é uma grande festa? Paga pra entrar? Só toca funk? Quem mora na favela cola no baile? Tem droga no baile? E a Polícia, não encosta? Aqui neste texto não viemos defender nem tão pouco criticar o baile, o foco é levar uma reflexão para que possamos enxergar o que é o tão famoso baile do helipa e quais seus impactos na comunidade.
O Observatório De Olho na Quebrada desde de 2019 levanta dados reais sobre a “festa” que acontece em Heliópolis, com objetivo de ouvir, refletir e produzir dados reais, dando voz aos frequentadores do baile, "turistas", comerciantes, e moradores das ruas que acontecem as concentrações. Essas pesquisas levantaram e responderam questionamentos muito importantes já que a Grande Mídia reforça uma visão estereotipada do que é o baile, e neste estudo são levantadas questões importantes como: Principais motivações para ir ao baile; Episódios de violência no baile; Pontos negativos do baile; Quem frequenta o baile mora no entorno; Essas perguntas são muito importantes para conseguirmos entender o que é essa movimentação que acontece todos os finais de semana na favela.
Em Heliópolis existe mais de um desses bailes, tem muita diversidade de sons, ambientes e públicos. Existem eventos que tocam forró, sertanejo onde as pessoas mais velhas normalmente costumam ir, esses são geralmente em algum bar que oferece churrasco gratuito mas a rua é fechada para a diversão do público. Outro tipo de evento é o baile funk, que são mais difundidos e conhecidos, essa festa hoje acontece simultaneamente em diversas ruas de Heliópolis, onde paredões de som simultâneos e a quantidade de pessoas no mesmo local chega até a assustar pela alta demanda. "O que eu mais gosto no baile é de beber, e ficar com o pessoal que conheço", conta Stefanni de 27 anos moradora e frequentadora do baile do Helipa.
A polícia se faz presente nesses eventos, mas por muitas vezes de forma truculenta a fim de marginalizar e expulsar quem participa, “Quando eles encostam mesmo, eles mandam parar o som, mandam todo mundo sair, jogam bomba de gás, quer bater, jogam a bebida fora, quando pegam para embasar fazem isso”. Complementou Stefanni sobre a abordagem policial.
Mas o baile não é somente frequentado por moradores, hoje existe uma alta demanda de pessoas que vem de fora só para curtir a tal “festa”, 40% do público frequentador do funk vem de fora, afirmando o quão famoso é o chamado "fluxo", sendo não somente da Capital, mas de diversas regiões de São Paulo. "De final de semana sempre tem turista, de sexta e sábado sobe muita gente lá pra cima no baile da Adriana (funk), e depois que todo mundo sobe, fica mais quem mora aqui embaixo”, explica Steffani.
(Turista é o termo dado as pessoas que frequentam o baile e não são moradores de Heliópolis)
Daniel tem 20 anos e saiu de São Miguel, extremo leste de São Paulo, para ir no baile de Heliópolis, ele faz parte dos 34% que se utilizam dos transportes públicos, “Tem muitos bailes aqui, mas não é a mesma coisa", explica ele. “Muita gente vai pra lá (Heliópolis) e é onde você também quer estar”.
A procura do público ‘turistas’ pelo fluxo na quebrada muitas vezes acontece devido a ausência desses espaços em seus bairros, não existe a liberdade para a criação dos fluxos e isso faz com que as pessoas vão onde há essa permissão. O entorno de Heliópolis, que corresponde a 29% dos frequentadores ‘turistas’, são exemplos de lugares onde não há opção de lazer/diversão para este público jovem. “Normalmente frequento quando não tenho opção de rolê e quando o dinheiro está curto”, diz Leonardo, morador do Jardim Patente.
Se por um lado o baile é a principal opção de lazer para o público que frequenta, do outro lado a ocupação desses espaços provocou uma grande mudança para quem mora nesses pontos, tornando-se um problema. Mesmo os frequentadores identificam as questões problemáticas causadas nas noites de fluxos, como o excesso de drogas e álcool, para 61% dos entrevistados a droga ilícita mais comum é o lança perfume, para 25% é a maconha, para 9% é a cocaina e para 5% é a “balinha”.
Dona Maria (nome fictício para preservar a identidade da entrevista) mora há quarenta anos onde hoje é um dos pontos do fluxo e enfatiza “Sexta tem paredão, sábado tem paredão, domingo tem paredão. De sexta e sábado é das dez da noite até às quatro da manhã e de domingo é das cinco às onze. É um som da bexiga, estremece tudo.” conta ela. “O barulho é tão forte que você não consegue dormir, você virá pra lá, você virá pra cá, você senta e não tem jeito” Dentre as principais preocupações dos moradores que sofrem com a superlotação dos bailes é o acesso da saúde (ambulância) a suas residências, todos têm o direito de ser atendidos como seres humanos que são, essa cultura precisa ser repensada.
O som alto nos bailes muitas vezes é razão de boa parte das problematizações com os bailes e ainda que 41% dos frequentadores concordam que o barulho alto dos ‘paredões’ incomodam os moradores, isso não faz com que os bailes ‘peguem mais leve’. “O barulho é tão forte que você não consegue dormir.” reforça dona Maria. “Não tem para onde correr e não adianta falar, quanto mais eu falar, mas eles aumentam.”
Maria já procurou os organizadores dos ‘paredões’ para encontrar uma solução, enfatizando que “se o barulho diminuir, não tem problema de colocar o paredão” e recebeu uma resposta desanimadora. “A moça que trabalha aqui disse ‘eles pagam e manda aumentar’, que eles têm direito de aumentar, isso não é justo. Não é justo.”
O barulho não agrada a todos, claro, mas para algumas pessoas que moram na rua do baile é uma coisa rotineira, para alguns até diversão, Kelly, de 40 anos, tem uma venda de bolos e lanches numa viela em frente o baile, para ela o barulho é rotineiro, considerado “normal”, “O som do paredão não me impacta em nada, porque eu gosto, então não me atrapalha em nada, já estou acostumada já” disse ela sobre o barulho. Para comerciantes como Kelly a renda obtida no baile é o total de sua renda ou parcial como o caso dela, para muitos deles a rua lotada, o som alto é o lucro que tem, pois seus comércios triplicam suas vendas no final de semana.
Os problemas do fluxo são inúmeros como apontados aqui, as vantagens são pontuais mas explicitamente necessárias para a manutenção desse tipo de “role”, segundo a maioria dos frequentadores, 66% responderam que os bailes não podem continuar da forma como acontecem hoje em dia. Outro ponto que até aqui não foi levantado, é a quantidade de lixo que é gerada nesses eventos, segundo a pesquisa 74% apontam o excesso de lixo nas rua após o fim do baile, esse dado é muito preocupante já que não existe um projeto efetivo de coleta seletiva dentro de Heliópolis, isso impacta no restante da população da cidade, o lixo não separado pode gerar diversas problemáticas para o meio ambiente e para a saúde populacional.
Os prós e contras do baile existem, claro que o olhar para cada um deles é um ponto de vista, porém o melhor respaldo que poderia ter para essa “problemática” é a resposta do poder público, como realocar o fluxo? Ou como garantir que o som não invada as privacidades dos moradores do entorno? Como fazer com que o direito de ir e vir e o direito de acesso a cidade seja respeitado? Essas e outras milhares de questões que podem ser levantadas acerca do tema é um problema social, um problema do estado que inviabiliza esses espaços fazendo com que a única saída para esses eventos sejam feitas dessa forma, nesses lugares e nessas circunstâncias.