Pesquisadores produzem estudo histórico sobre a contaminação na área da COHAB e Cingapura em Heliópolis
A linha do tempo produzida pelos jovens pesquisadores do Observatório De Olho na Quebrada busca retratar o histórico de contaminação e os impactos na vida dos moradores da Quadra L em Heliópolis
O que tá pegando?
No dia 30 de março de 2023, mães e pais de alunos da EMEF Péricles Eugênio da Silva Ramos, uma das principais escolas que atendem os moradores da Quadra L em Heliópolis, foram informados que a escola passaria por uma reforma hidráulica e que estaria fechada por cerca de 180 dias. Diversos pais presentes na reunião saíram de lá indignados, pois havia sido feita uma reforma na escola recentemente. Após o fechamento da escola ter uma repercussão maior, foi divulgado o verdadeiro motivo, que a escola estaria em reforma por conta de uma contaminação de gás metano.
O fechamento da escola e a falta de dados e informações à população deram origem a esse estudo, que teve início por meio de diálogos com lideranças locais e moradores da Quadra L, conhecida como COHAB e Cingapura. Durante esse processo de contato com a comunidade, a equipe do Observatório De Olho Na Quebrada participou de reuniões sobre o fechamento da EMEF Péricles Eugênio da Silva Ramos, com destaque para a audiência pública realizada em 23 de agosto de 2023 na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. O evento contou com a presença de moradores da região e representantes da CETESB (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) e foi mediado pelo deputado estadual Emídio de Souza. Além disso, este estudo traz um levantamento histórico do processo de uso e ocupação do território onde hoje se localiza a Quadra L, apresentando uma linha do tempo que abrange do início do século XIX até os dias atuais.
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As primeiras empresas se instalaram na Vila Carioca por volta dos anos 1809 até 1918, algumas delas se fizeram presentes no território por muitas décadas. Em 1867, nasceu o parque industrial Paulistano à beira do rio Tamanduateí e Tietê. Tinha uma ótima localização devido a sua proximidade a linha do trem e os preços baixos dos terrenos no entorno. Esse parque era formado principalmente por empresas de porte médio e pequenas oficinas.
Somente em 1918 as Indústrias Reunidas Fábricas Matarazzo se instalaram na área, e adquiriram a fábrica de sabão, óleo e graxa Pamplona. Este local era usado para abrigar produtos químicos como mercúrio, hexaclorobenzeno e outras substâncias, que acabaram por contaminar o solo e corpos d'águas subterrâneas. O Grupo Matarazzo faliu, e suas instalações hoje são escombros.
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Em 1972, em uma área de 220.000m² dentro de Heliópolis, foi inaugurada uma base de distribuição de combustíveis da Petrobrás. As operações estavam relacionadas ao carregamento e descarregamento de caminhões-tanque, armazenamento e distribuição de derivados de álcool, gasolina, óleo de combustíveis, solventes aromáticos, entre outros.
Em 1975, São Paulo foi o único município da região metropolitana que destinou parte de seus resíduos urbanos para aterros sanitários, incluindo Heliópolis. Aproximadamente 1,4 milhão de toneladas de resíduos urbanos coletados naquele ano, 58,5% foram dispostos em aterros sanitários, 22,7% em lixões, 12,5% em usinas de compostagem e 6,3% em incineradores. Aterros sanitários são preparados para receber o lixo de uma forma que não polua o território. Existe legislação para esses territórios, mas para os lixões, não existe esse tipo de legislação.
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Em 1988, iniciou-se a construção da gleba L, no intuito de abrigar funcionários públicos, já pensando na verticalização do território e na especulação imobiliária, já que a área é bem localizada. Com a resistência dos moradores, essas moradias foram direcionadas para parte das pessoas que foram realocadas do alojamento provisório que ficava próximo a Rua Coronel Silva Castro. Nesse mesmo ano se iniciou a construção da EMEI Joaquim Antônio da Rocha, da EMEF Péricles Eugênio da Silva Ramos e da estação de tratamento de esgotos do ABC, localizada junto a Av. Almirante Delamare e a margem esquerda do Córrego dos Meninos, ela serve às cidades de Santo André, São Bernardo do Campo, Diadema, São Caetano do Sul, Mauá e parte da cidade de São Paulo, incluindo o território da quadra L.
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Em 1993, o Ministério Público do Estado de São Paulo recebeu uma denúncia do Greenpeace e do Sindicato dos Trabalhadores no Comércio de Minerais e derivados de petróleo do Estado de São Paulo, a Shell foi acusada de poluir o ar com substâncias nocivas à saúde e contaminar o solo com chumbo, de acordo com um estudo do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT-SP). Os moradores pediam que a Shell respeitasse a lei do silêncio que é fazer menos barulho a partir das 22h da noite, e que trafegassem com caminhões apenas nos horários permitidos e instalassem filtros para reduzir o cheiro de combustível no ar.
De 1994 a 1995 aconteceu a construção da L2 e as famílias “beneficiadas” foram as que antes moravam na lavanderia, essas famílias se mudaram no final de 1996. O serviço de fortalecimento de vínculo (CCA) é um espaço de convivência para o desenvolvimento de ações socioeducativas com crianças e adolescentes, que buscam fortalecer os vínculos familiares e o convívio grupal, comunitário e social, o CCA Santa Ângela foi construído no território nessa mesma época. A administração e parceria do serviço já existia próximo a lavanderia assim também ganhou seu espaço na gleba.
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De 2000 a 2002 – O território foi reconhecido como contaminado pelo estado e essa decisão foi tomada com 60 anos de medições. Em 2002, uma pesquisa mostra que 70% dos domicílios tinham casos de doenças respiratórias e alérgicas, e 40% relataram casos de dor de cabeça (alto índice de disfunções na tireoide um caso a cada quatro residências entrevistadas, em Maio de 2002).
Em Junho de 2002, laudos da CETESB e da vigilância sanitária indicam a contaminação de poços existentes no entorno da empresa, entre eles o aquífero que abastece o Condomínio Auriverde que utiliza a água para cerca de 400 pessoas residentes na Vila Carioca, a CETESB processou a Shell em 105,2 mil reais por estocagem irregular de combustível que contaminou o solo da Vila Carioca implantando assim a criação da SOS Vila Carioca que visa a implementação de políticas públicas e a reabilitação ambiental do bairro pela poluição industrial.
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Em dezembro de 2011, a CETESB, divulgou uma lista atualizada em 4.131 áreas contaminadas na cidade de São Paulo. 16 delas estão em Heliópolis. 6 anos depois, aconteceu a inauguração de equipamentos de saúde (UBS Heliópolis e CAPS AD II Heliópolis), a abertura dessa ubs seria uma retratação da empresa shell e petrobras pela contaminação a ideia é que a unidade fizesse o acompanhamento da saúde dos moradores da quadra l, esse processo nem teve início. Em 2018, junto a essas ações físicas de mudança e prevenção no território, houve a mudança para permear o solo junto a análise do perfil do solo (que identificava as camadas da terra abaixo do chão).
Se tratando de análises, de março de 2016 a fevereiro de 2018, as medições dos gases foram feitas diariamente e, de março de 2018 a março de 2021 foram feitas três vezes por semana. Em novembro de 2018, foi realizado o relatório "Readequação do Plano de Intervenção à DD-038/2017 (Sistema de Remediação por Contenção)" com o objetivo de estudar os risco das áreas envolvida e prever instalações de barreiras físicas no solo para parar a contaminação, que foi avaliado no Parecer Técnico no 126/2019/ICRR. Já em 2019 Não foram apresentados os relatórios dos resultados do programa de monitoramento de mar/2019, mai/2019, ago/2019, nov/2019, mar/2020 e abr/2020, no ano de 2019 a WEBER Ambiental começou a monitorar os gases e vapores de lá. Além do levantamento de algumas questões do sistema de exaustão de gases/vapores do solo, destacando que seu objetivo não é a remediação do solo que é a recuperação do ambiente degradado, mas sim evitar a intrusão de gases nas edificações. Também foi mencionado que era impossível igualar a pressão causadas pelos gases no solo e teve a sugestão do uso de trincheiras (buracos na terra) para o fluxo de gases.
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Em março de 2022, a E.M.E.F. Péricles Eugenio da Silva Ramos foi obrigada a fechar as portas por 180 dias, a justificativa foi que a escola passaria por reformas hidráulicas, quando na verdade era pelo o risco de explosão devido os altos níveis de metano no solo, por algum motivo a escola ao lado não teve seu fechamento decretado, repetindo uma informação antes apresentada, a região é alvo de alta especulação imobiliária.
Em Junho de 2002, laudos da CETESB e da vigilância sanitária indicam a contaminação de poços existentes no entorno da empresa, entre eles o aquífero que abastece o Condomínio Auriverde que utiliza a água para cerca de 400 pessoas residentes na Vila Carioca, a CETESB processou a Shell em 105,2 mil reais por estocagem irregular de combustível que contaminou o solo da Vila Carioca implantando assim a criação da SOS Vila Carioca que visa a implementação de políticas públicas e a reabilitação ambiental do bairro pela poluição industrial.
O ofício nº. DITEC-0542/22, do dia 04 de março de 2022, trata da entrega de um relatório referente ao processo CETESB 039155/2018-53, relacionado ao Conjunto Habitacional Heliópolis L-Gleba I e II. O relatório foi protocolado digitalmente no sistema E-Ambiente e contém informações sobre as questões abordadas na informação Técnica CETESB nº 164/2021/ICRR. Os arquivos anexados incluem o próprio relatório e relatórios de monitoramento das datas solicitadas.
Em 2022, foi expedida uma Informação Técnica da CETESB - contendo dados de anos anteriores, o documento apresenta uma avaliação dos documentos e relatórios do monitoramento das medidas para diminuir os riscos do metano e outros gases na quadra. A última manifestação técnica da CETESB sobre o assunto foi a “Informação Técnica (IT) no 164/2021/ICRR”, do dia 23/07/2021.
Após recomendações da CETESB, foram expedidos os "Relatórios de Medição: Evolução do Monitoramento de Gases e Operação do Sistema de Ventilação na Cohab Heliópolis – Gleba L", elaborados pela Weber referentes aos meses de junho a novembro de 2021.
Devido ao não cumprimento completo das exigências técnicas da IT no “164/2021/ICRR”, por algum motivo foi concedido um prazo adicional de 60 dias, conforme o “Ofício no DITEC-0542/22”, do dia 04/03/2022. Documentos anexados a este ofício incluem um comunicado da empresa Weber com comentários sobre a “IT no 164/2021/ICRR”, uma tabela de medições nos poços subsolam (tipo de máquina que analisa os vapores dos poros no solo) referentes aos monitoramentos de janeiro de 2020 a fevereiro de 2022, e relatórios dos resultados do programa de monitoramento de poços de gases, poços subslab e pontos de infraestrutura para os anos de 2019, 2020 e 2021.
Atualmente, a área é classificada como Área Contaminada Crítica (ACC).
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Concluímos:
A análise da linha do tempo evidencia que o Estado não realiza um gerenciamento adequado da área da Quadra L em dois aspectos fundamentais: a autorização e a falta de monitoramento das empresas em relação ao descarte de produtos poluentes, além da construção de moradias em áreas previamente identificadas como contaminadas. Esse descaso também se reflete na negligência governamental quanto à situação educacional das crianças, uma vez que não houve qualquer apoio à EMEF Péricles Eugênio da Silva Ramos nem ao CEU Meninos (Centro Educacional Unificado). Essa omissão parece estar atrelada ao interesse em fomentar novos empreendimentos comerciais em uma das regiões mais valorizadas da zona sudeste da cidade de São Paulo, situada entre áreas industriais, bairros de alto poder aquisitivo e o município com o maior IDH do país.
Além disso, as empresas identificadas como responsáveis pela contaminação demonstram falta de compromisso com a causa ambiental e violam direitos humanos ao negligenciar os impactos à saúde dos moradores. Buscando minimizar as acusações contra si, evitam a testagem dos residentes dos conjuntos habitacionais, temendo a comprovação da relação entre a contaminação ambiental e os casos de doenças da tireoide, que podem evoluir para câncer.
Contrariando narrativas que responsabilizam os próprios moradores pela situação, fica evidente que a população não tem culpa alguma no agravamento desse cenário. Pelo contrário, devido à lógica de ocupação e deslocamento populacional na cidade, essas famílias foram forçadas a viver em uma área de alto risco para sua saúde e bem-estar. Diante desse contexto, fica evidente que estão sendo vítimas de racismo ambiental.
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O Observatório De Olho Na Quebrada é resultado de um projeto idealizado e executada desde 2018 pela UNAS Heliópolis e Região, que conta hoje com o apoio da War Child e da Open Society Foundations.
O Observatório é formado por um grupo de jovens pesquisadores, engajados em um processo de Geração Cidadã de Dados e de resgate das histórias locais, com o objetivo de combater os discursos que alimentam preconceitos contra as favelas e comunidades urbanas. O nosso propósito é dar destaque às potências e aos reais conflitos de Heliópolis e de outras quebradas do Fundão do Ipiranga, e, ao mesmo tempo, por meio de processos formativos, potencializar as juventudes locais como lideranças de seus bairros.
Para isso, realizam pesquisas e produzem informações que ajudam na criação de políticas públicas, projetos sociais e atividades que atendam às demandas dos nossos territórios.